sexta-feira, 11 de junho de 2010

Prolegômenos de Kant



Immanuel Kant é um daqueles pensadores que todo mundo já ouviu falar, mas pouquíssimos leram e entenderam. Alguns tentaram ler e, por não entenderem nada, desistiram. Outros nem se arriscaram diante da fama de infant terrible deste grande filósofo alemão. Mesmo desconhecido fora dos círculos acadêmicos, Kant é extremamente respeitado. Lembro de Nietzsche que dizia que sua autoridade advinha do fato de ninguém o entender. Com Kant é a mesma coisa. Ninguém lê ou entende, mas todo mundo respeita.

Mas há raros momentos em que os grandes filósofos, encimados nas mais altas montanhas do pensamento, decidem ter compaixão por nós, simples mortais, escrevendo uma obra mais leve, “mais fácil”, que possa instruir essa massa de retardados sobre suas ideias. Hegel com sua Estética, Nietzsche com sua Genealogia da Moral, Heidegger com seus Seminários de Zollikon, Foucault com sua Microfísica. Há vários exemplos.

É muito difícil – e não digo impossível por uma questão de educação – que alguém que não possua uma boa formação filosófica consiga entender a Crítica da Razão Pura de Kant. Esta obra basilar do pensamento filosófico Ocidental compõe, ao lado da Crítica da Razão Prática e da Crítica da Faculdade de Julgar, o alicerce monumental do pensamento kantiano e que constitui uma verdadeira convergência do pensamento filosófico que a precedeu. O problema é que a maioria dos leigos começa o enfrentamento com Kant através da primeira Crítica. Isso é covardia.

O momento de bom humor deste pacato cidadão de Königsberg se dá na sua obra Prolegômenos a toda Metafísica Futura. Aqui Kant explica de modo “sucinto” algumas concepções fundamentais que aparecem na Crítitca da Razão Pura, mas despidas dos longos, tortuosos, profundos e difíceis parágrafos que pululam o tempo todo na Crítica. O Kant dos Prolegômenos estava repleto de compaixão por nossa estupidez.

Kant discute as fontes da Metafísica, portanto, do conhecimento, e daí começa a elaborar sua teoria sobre os juízos: sintéticos e analíticos – bem como sua compreensão sobre espaço e tempo, condições a priori de todo conhecimento. Questiona-se sobre a possibilidade da Metafísica e chega à questão inevitável: Como é possível um conhecimento pela razão pura? Explica-nos que a experiência “não é senão uma contínua adição (síntese) das percepções” e explica os fundamentos do conhecimento matemático e a representação de conceitos na intuição, bem como de juízos intuitivos e discursivos, chegando às proposições apodíticas. Para Kant, a intuição “é uma representação que depende imediatamente da presença do objeto”.

Na segunda parte do livro, Kant discorre sobre a possibilidade de uma ciência pura da natureza. A natureza, em Kant, é “a existência das coisas enquanto esta é determinada segundo leis universais”. Então, ele partirá para discutir a necessidade, a experiência, os juízos empíricos, a percepção. É aqui que Kant nos mostra o seu Quadrológico dos Juízos: Segundo a quantidade, qualidade, relação e modalidade. O Quadro transcendental dos conceitos do entendimento: idem e o Quadro fisiológico puro dos princípios gerais da Ciência da Natureza: Axiomas da intuição, Antecipações da percepção, Analogias das experiências e Postulados do pensamento empírico em geral. Uma abordagem nova diante das Categorias de Aristóteles.

Por fim, discutindo a questão transcendental capital – Como é possível a Metafísica em geral – Kant nos brinda com uma explanação “leve” – será isso possível?! – sobre a dialética da Razão Pura e chegando aos limites mesmos desta mesma Razão.

Para quem já se aventurou pelo pensamento de Kant e saiu derrotado ou para quem tem medo dele, aconselho a começar por esta obra. Será um encontro mais amistoso com este monstro do pensamento humano. Monstro, diga-se de passagem, no sentido de grande, maravilhoso, genial. Ler Nietzsche sem conhecer Kant é ler meio Nietzsche. Por isso, creio eu, seria importante conhecer um pouco melhor ou simplesmente começar a conhecer este pensador tão original e responsável por uma verdadeira revolução na nossa tradição e que depois, ainda como hoje, continua sendo amado ou odiado, mas sempre estudado.

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